Pássaros rasgados com o vento Rajadas estilhaçadas Céu quebranto Amores e prantos Naufrágio sem resgate Espera pelo vão abissal dos deuses O silêncio confronta a pele Muda, crua, sua Estrelas do mar nas cicatrizes Salgadas do mar Espuma dos dias calados Subtraio as pálpebras pesadas Nas profundezas do tempo Submerso nas asas da memória O verbo transformado em sangue Percorre os hemisférios da minha dor Espero os sete segundos das ondas Arrebentarem Nas profundezas abro os olhos Meu nome é longe
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Cego à noite
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Não ouço mais nenhuma voz. Oco, passa o vento, nenhum sinal. Eu cantaria você, faria música para vestir, rasgaria meus poemas, calaria meu mal. A saída está no canto da porta, naquele olhar invisível que perpassa o meu sentido. Caí mais um tom, caí sem voz. Ouço o barulho da chuva apenas. Minha epiderme não respira, absorve. Minha pele rasga a dor, meu sonho perdeu o fim. Cego à noite, perco meu trilho, busco as lembranças ao amanhecer. Meus olhos não abrem mais, carregados de mar. Permaneço na tempestade, neste tempo suspenso. Minha saliva tem gosto de sal, minha febril vertigem persegue a salvação. Todo o universo veleja nessa paisagem sem cor. Seria onde busco os tigres de capa branca e negra. Seria onde o rugido do mar afunda no abismo do continente. Seria onde a palavra, que gasta, que valha, que dá o sentido à arma, foi apontada para minha cabeça. Coração partido não é metáfora.
Perder-me
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Perder-me, dissolver todos os tecidos da pele, refazer-me. Em um segundo, passo do sonho ao concreto, deixo as cicatrizes mais profundas, abro outras, sangro por todas as frestas, desapareço. Um dia paisagem, sol, plano. Uma vida toda. Num instante, o céu muda, o vento sopra. Prenúncio de tempestade. Caí no abismo sem fim, percebi a veia dilatada do meu pulso, os olhos cheios de silêncio e lágrimas. Percorri as pausas das linhas das mãos, abri as janelas, escancarei todas as dores e revirei as palavras − dissecando letra por letra as últimas escritas − as que revelam, as que maltratam, as que fazem acontecer a cisão. Encontrar, um dia, quiçá, as flores abertas no jardim, sentir novamente o cheiro dos jasmins à noite, parar o horizonte e ver nos seus olhos a intensidade da certeza, o meu reflexo na sua pele interminável, o porto-miragem compassado às batidas do coração. Em um dia, por uma vida inteira.