quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Cego à noite




Não ouço mais nenhuma voz. 

Oco, passa o vento, nenhum sinal. 

Eu cantaria você, faria música para vestir, rasgaria meus poemas, calaria meu mal. A saída está no canto da porta, naquele olhar invisível que perpassa o meu sentido. 

Caí mais um tom, caí sem voz. Ouço o barulho da chuva apenas. Minha epiderme não respira, absorve. Minha pele rasga a dor, meu sonho perdeu o fim.

Cego à noite, perco meu trilho, busco as lembranças ao amanhecer. Meus olhos não abrem mais, carregados de mar.

Permaneço na tempestade, neste tempo suspenso. Minha saliva tem gosto de sal, minha febril vertigem  persegue a salvação. 

Todo o universo veleja nessa paisagem sem cor.

Seria onde busco os tigres de capa branca e negra. Seria onde o rugido do mar afunda no abismo do continente. Seria onde a palavra, que gasta, que valha, que dá o sentido à arma, foi apontada para minha cabeça. 

Coração partido não é metáfora.

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