A paisagem inverteu, o sol caiu, o mar inundou os olhos. Não existe mais lugar algum. Acabou. O imaginário mudou para sempre, a criança estendida na praia vai continuar ali, trazida pelas ondas, levando para sempre a delicadeza. Não seremos mais iguais diante disso. Ou espero que não.
Partimos para outro hemisfério, aquele que não cria raízes, aquele que não aprendeu a andar, aquele que ficou completamente surdo e cego, aquele que não tem chão, nem cama, nem sonho.
Antes ficasse para sempre a imagem da criança, do mar, do sol ligada à certeza, à esperança, à alegria. Antes chegasse pelas marés o sorriso, a leveza, a ventania. O deserto invadiu o mar. O mar cessou a poesia. As ondas refletem o céu.
Não há redenção. Não há salvação. Existe apenas o abandono, a tristeza, a devastação. Nessa terra sem bússola, sem margem, sem saída, partimos para lugar algum, seguimos blindados enquanto as crianças chegam trazidas pelas marés.
Publicado na Revista Ideias/outubro